(ATENÇÃO: texto com mais de 1700 palavras, precisa mais do que 30 segundos para leitura e compreensão, contém assuntos para pessoas com mais que 2 neurônios ativos)
Uma pessoa beirando os 60 anos de idade, já habituada a falar que a juventude de hoje não presta e está errada em tudo, provavelmente é adepta de uma das tolices que está em texto anterior neste blog, a repetição parental (Repetição Parental – Antitolices). Até aqui, sem maiores problemas é uma falha induzida pela tolice. O que importa é a faixa etária citada, que é apesar de mais numerosa, na prática, o “foco de tudo” continua apontado nas jovens, aqueles da faixa etária bem menor, abaixo de 20 anos. Este foco para a minoria, leva a tolice de sempre tentar consertar falhas ao invés de agir no tempo certo, com dados e percepções atuais, para aplicar recursos de forma racional. Esperar até 2030 para ler dados que registram o que já percebemos agora, coloca na sociedade atual a classificação de tolos a nível máximo. Será comum ouvir de uma pessoa com 20 anos de idade, ao ter conhecimento do que fazemos hoje, algo como: “o pessoal de 10 anos atrás foi bem burrinho né?”.
Antes de entrar no assunto, acredito que seja essencial o entendimento do que é uma faixa etária. Parece piadinha, mas, tenho uma história pessoal neste sentido que vai ilustrar melhor esta necessidade. Em um sábado comum, acompanhado da minha belíssima noiva, entramos em uma loja telhas e nela a recepção foi feita por um vendedor típico da época, cheio de tentativas de ser simpático e muito falador. Informamos a nossa necessidade para cobertura de uma pequena casa e pedimos para conhecer as opções disponíveis. Ele percebeu que nosso perfil não era de pessoas financeiramente abastadas, então nos mostrou telhas do tipo Romana, Francesa e Portuguesa. Lembrando que estamos falando de modelos de telhas de cerâmica e não de sabor de pizza. Perguntamos ao vendedor os preços e a resposta foi um valor único que questionamos, por ter apresentado três modelos diferentes. Então com toda desenvoltura e certeza do que estava falando ele nos respondeu novamente: “é tudo nessa mesma faixa etária mesmo”. Antes de sair da loja estávamos rindo e não conseguíamos disfarçar. “nessa faixa etária”. Por isso lembro aqui que faixa etária é aplicada somente para analisar idade. Valores, faixa de preços, quantidade de peças ou qualquer outra coisa que não tenha relação com idade, não pode ter uma faixa etária.
A tolice identificada não tem relação com o vocabulário limitado do vendedor de telhas. Convido a quem está lendo que faça uma análise das questões relacionadas a empregos, trabalho, marketing, desenvolvimento de produtos e até ações governamentais. Apesar de ser evidente, de não precisar nada além de observação simples, a mais frequente faixa etária dos brasileiros está longe de ser a soma de pessoas com menos de 20 anos. Há relações com a lógica simples, quando antes mesmo do início deste milênio, ali na virada de 1999 para 2000, qualquer pessoa poderia perceber que era uma raridade encontrar casais com 6, 8 ou 10 filhos. Em grandes centros urbanos essa percepção estava ainda mais simples, nítida. São muitos os fatores, desde o custo de vida até a mudança do perfil de “vovózinha” nas mulheres, passando por crises econômicas e entrando em assuntos mais densos, como religiões e liberdades. Estes fatores não somente impactaram na redução do número de filhos por casal, mas, escancaram a lógica em que: menos filhos por casal, resulta em menos jovens na soma da população atual. Talvez por ser muito simples, seja tão ignorada esta percepção e por ser mais fácil de mostrar falsa autoridade no assunto, pessoas com espaço para falar em público, preferem perpetuar o discurso do passado, citando sempre a tolice parecida com “precisamos nos preocupar com os jovens, a chegada dele ao mercado de trabalho” ou ainda pior do que isso, falar sobre a preocupação com o que os jovens estão consumindo.
Para deixar mais evidente o porquê de considerar uma tolice focar na faixa etária sub 20, convido a um raciocínio “rápido”. Voltamos ao período 1940 e vamos avaliar a sequência a partir de um casal que nesta época esteja na faixa dos 60 anos de idade (marido e esposa). Era normal que tivessem pelo menos oito (8) filhos, logo o número de pessoas com a idade do casal era menor que o de jovens. O Censo de 1940 contabilizou população em torno de 41 milhões de pessoas e abaixo dos 20 anos, a soma era 22 milhões, podemos arredondar para 50% da população nesta faixa etária naquele momento da história. Avançando 40 anos, para a época 1980, vamos pensar também em um casal na faixa de 60 anos de idade. Nesta época, o número de filhos já era bem menor, porém, ainda era normal encontrar casais com 4 filhos. Dados do Censo, população de 119 milhões e com menos de 20 anos 59 milhões, arredondando ficamos com 49%. O número é frio, mas, a percepção para o casal com 60 anos é de menor presença de jovens ao seu redor. Avançamos para 2010 e temos 190 milhões de pessoas, sendo 62 milhões com menos de 20 anos, arredondando para 32%. Nesta última época, para um casal com 60 anos de idade, é perceptível que a dinâmica da vida mudou para casais com normalmente no máximo dois (2) filhos e as pessoas com a mesma faixa etária do começo do raciocínio, já aparecem com mais frequência… Pouco tempo depois, em 2022 é normal que Enzo, Gabriel, Isabella e Elena sejam filhos únicos de pais que em breve terão os mesmos 60 anos que o casal com oito (8) filhos de 1940. Os dados do Censo realizado em 2022 serão desprezados neste raciocínio, por ser uma tolice utilizá-los, considerando o contexto. Mas, trazendo para o tempo atual o casal de 60 anos que em 1940 percebia ao seu redor muitas pessoas com menos de 20 anos, eles teriam sem muito esforço a percepção de muito mais pessoas na mesma faixa etária deles do que a turma do Enzo. Se tua ansiedade permitiu acompanhar o raciocínio até aqui, tenho a certeza da percepção sobre qual faixa etária deve ter atenção maior em assuntos como trabalho, marketing, ações sociais, etc.
Afunilando, podemos separar um tema, o trabalho. Considerando o raciocínio sobre a pirâmide etária no Brasil, para qual faixa teremos a tua atenção especial? Combatendo a tolice do que é feito e falado desde sempre, podemos pensar no tamanho do problema que estão enfrentando neste momento as pessoas na maior faixa etária da população, aquela que está acima dos 40 anos e por alguma razão procurando trabalho. Mesmo sem publicar explicitamente, as empresas colocam limitadores de idade para novas vagas. Há fatos comprovando que não é descrito nos anúncios de vagas, mas, candidatos com mais de 40 anos sequer são avaliados. Exceto em funções muito específicas, onde menos de 5% da população atenderia aos requisitos. E de onde vem esta tolice? Da cultura de pensar, falar e focar nos jovens que estão entrando no mercado de trabalho.
Por mais óbvio que pareça o cenário, vai demorar para mudar a tolice impregnada na cabeça dos chamados gestores e fazer com que eles tenham ações neste momento da história, voltadas a priorizar trabalhadores com mais de 40 anos. Todos sem exceção, procuram desenvolver formas de atrair os jovens. É algo praticamente automatizado e passamos a ter empresas ainda pensando que mesa de sinuca, horário flexível, gamificação das atividades e happy hour sejam atrativos aos com menos de 40 anos, com um detalhe agravante de tolice: como aplicar estas coisas em trabalhos operacionais, o famoso “chão de fábrica”, aquele trabalho que pode sujar a mão e talvez tenha que fazer força. O resultado é outro clichê: temos vagas, mas, não temos pessoas qualificadas para elas. Continuando a praticar a tolice, fica fácil perceber que no clichê será trocado a palavra qualificadas por interessadas.
Somente neste assunto trabalho, é possível alongar este texto sem ao menos expor uma pequena fração do problema. Aos que estão mentalizando agora a palavra exagero, sugiro lembrar-se de um detalhe: pessoas sem trabalho também são pessoas sem renda. Lembrando também que pessoas sem renda, atualmente, são transformadas em invisíveis. Estando invisível e na faixa etária de maior número na população, temos o desencadear de grave sequência de problemas. Entre eles uma frequente tolice, aquela turma com mais idade e menos maturidade, um comportamento de tentar parecer mais jovem do que é, complicando a evolução da espécie humana. Mas, este é outro assunto, para abordagem em outra oportunidade.
Uma forma de antitolice é não esperar ações governamentais, obrigações por força de lei, para começar a agir agora, percebendo que a dinâmica social está em alta velocidade e realmente não vale a pena esperar dados de um próximo Censo. Ouvir “a população está envelhecendo” e apenas concordar, pode induzir ao erro de não perceber que já envelheceu. O impacto é real no ciclo de produtos, na continuidade de negócios, na linguagem, na estética do que é produzido em áudio e vídeo, em tudo que é relativo a atividade social. Obviamente que não está sendo sugerido esquecer da faixa etária abaixo de 40 ou 20 anos. A antitolice é mudar o foco, trazendo a partir de já, outro formato, onde a maioria seja contemplada.
Quanto a trabalho, para a faixa etária atualmente abaixo de 20 anos, será um desafio aos com mais idade, entender que para eles a formalidade da CLT não interessará. Também renda limitada e no formato pagamento mensal é pouco atrativo. Horário “das 8 às 18”, esqueça, segunda a sexta então, já é repulsivo agora. Como gerar renda de formas alternativas, tudo bem, já é possível perceber que alguns conseguem resolver. Como lidar com as pessoas que hoje tem 40 e logo mais terão 70, isso não está no mindset do momento.
Equilíbrio é uma forte antitolice. Onde se vê predominância de coisas voltadas para “os jovens”, é necessário colocar coisas e pessoas “menos jovens”. Não no futuro, mas, agora. Exemplos são muitos, até não óbvios, como abrir espaço para pessoas com mais de 40 anos iniciar uma nova graduação, ter uma nova profissão, fazer mestrado, doutorado. Para simplificar, se na propaganda, no espaço físico, na moda, a predominância for de rostos joviais, é melhor mudar o cenário, equilibrar. Em 2030? Não, já.
