Bandido bom, era o bandido burro!

          Tem algumas frases que são difíceis de aceitar no sentido literal e são horríveis no sentido figurado. Frases toscas, de mensagens ruins e quando espalhadas entre pessoas que se dão bem com aberrações, serão pilares de tragédias irreversíveis. Uma delas já está espalhada e nada do que possa ser feito, vai tirar do subconsciente destas pessoas a mensagem absorvida. Quando o assunto sair da moda, o máximo que pode acontecer é deixá-la em standby, ficará adormecida, nunca apagada. Há quem queira chamar essas frases de ditado popular, dando ares de irrelevância e há quem faça uma leitura mais séria, apontando para o acionamento dos mecanismos cerebrais da agência, servindo como guia do que a mente doentinha vai transformar em atitude. O espalhamento destas frases, emburrece e bloqueia a percepção do que tem de falso nelas, o que de longa data sabemos que é atrativo, dá vontade de acreditar. Nem mesmo um ídolo muito popular será capaz de desconstruir uma frase dessas, sempre haverá uma pessoa que vai manter e repassar, mesmo que seja com a observação que comprova a burrice: “sei não viu, é melhor desconfiar, vai que…”.

          “Bandido bom é bandido m0r to” é um dos exemplos. Qualquer pessoa argumentando com esta frase, expõe seu baixo nível de inteligência e a sua limitadíssima capacidade de pensar sem ser induzida a erro. A crueldade, o desequilíbrio mental que leva a praticar o mal, deveria ser fator de exclusão direta da convivência em sociedade, tratando pessoas com essa falha ética, de forma diferente, considerando de imediato que não é compatível com a evolução humana. Deveria, mas, o que fazer com a raiva que aciona também o desejo (humano) de vingança? Para resolver o dilema, foi mais fácil criar uma espécie inédita até então, o bandido. Sim, fere as regras da biologia, as teorias vigentes, mas, em qualquer conversa sobre o assunto neste momento, o padrão que figura no pensamento de quem fala, é o de uma espécie diferente da nossa. Em um exercício, havendo habilidades de desenho em todas as pessoas, seria muito fácil dar formas ao que se tem como figura do bandido, que segundo a frase citada, deveria ser m0r to.

          Todo bandido deve ser m0r to? Aí começa o problema. Como muitas das nossas palavras, derivadas de outros idiomas, o significado para o brasileiro é aleatório, cada pessoa escolhe se vai optar pelo formal ou ter o seu próprio entendimento ou ainda, seguir o que a turma está falando, sem se importar com significado, sentido ou origem. Partindo de pessoa que deve ser banida por estar ou se comportar a margem da lei, passando a frase em análise neste texto, o entendimento de bandido será bem relativizado na resposta à pergunta inicial. No fictício exercício proposto, estelionato não entra no desenho da nova espécie, manipulação de massa popular pelo poder de cargo político, também não. Responsável por acidente com vítimas ou danos físicos em outras pessoas, aí vai depender de alguns critérios como: de quem é filho (a), qual o sobrenome, qual a opção eleitoral declarada, se é pessoa muito bonita ou gostosa, artistas famosos, cor da pele e tudo que a aparência da pessoa mostre de diferente do desenho da espécie. Estas características, automaticamente transformam quem esteve a margem da lei em “veja bem, não é assim que funciona”.

          A principal falha da frase em análise é a sua existência e outra a ser apontada, é a que transforma o contexto em uma imensa tolice. A frase não leva em consideração a evolução do bandido (a). Não há mais burrice nos mais perigosos bandidos, estes que sequer a sociedade identifica como pertencentes a espécie criada. Com o passar do tempo, o modo de vestir, falar, agir e participar do cotidiano, camuflou entre a nossa espécie os daquela. Hoje, o desafio para identificar um bandido, não é mais visual e precisa de mais inteligência. Está comprovado que o que chamamos de polícia, tem ferramentas e pessoas capacitadas para agir. Da mesma forma, está comprovado que a espécie bandido, conseguiu evoluir rapidamente, ficando um passo a frente da polícia. A inteligência da espécie que deveria ser eliminada, permite até transformar em um deles, os que são da polícia. Estes, mesmo identificando a inteligência daqueles, não reagem, não atuam e os motivos são conhecidos, as práticas também. Acabamos o raciocínio, chegando à conclusão de que essa evolução da espécie bandido, vai proporcionar a classificação “veja bem, não é assim que funciona”, transformando os verdadeiros bandidos em pessoas que parecem contribuir para a sociedade, com moral e ética impecáveis. Sendo assim, mesmo que pegos fazendo o que de melhor sabem fazer, não devem ser eliminados.

          O bandido bom era o bandido burro. Aquele que a roupa vestida já entregava que não era boa coisa. Aquele que deixava rastros óbvios, que não se importava em ser chamado de ladrão e que no bar todos sabiam que era matador. Este era o bom bandido, porque era facilmente identificado, tinha as características que fizeram parte da composição da espécie que vem na mente das pessoas. Ainda existe alguns deles, estão entrando em lista de espécie em risco extinção. Curiosamente, por mais aberração que possa parecer, algumas pessoas não são da espécie bandido, mas, gostam de falar, fazer gestos ou tentar parecer com um deles. Parece que experimentam uma sensação de poder, igual a portar uma arma como forma de intimidar outras pessoas ou simplesmente é fetiche mesmo, a imagem do bandido perigoso da ficção, do membro de gangues e outras bobagens que frágeis mentes absorvem. Além do caminho da extinção, esta espécie começa a sair da moda, por ser presa fácil, por ganhar menos, por ter menos poder, por ter vida curta e por ser burra.

          Foi bom o bandido burro somente para criar uma espécie e tirar a atenção ao bandido de verdade. A frase do bandido bom é bandido m0r to, virou uma ferramenta fantástica de alavancagem de negócios incrivelmente lucrativos. A raiva que a frase contém, o sentimento de justiça feita e vingança (mesmo que sejam coisas diferentes), é leite condensado no pão de quem está ganhando muito com o business. Entre outras consequências, com a infantilização da vida adulta, chegamos ao risco real de trazer o subconsciente criado em games, onde matar gera pontos e avança de fase, para as ruas de verdade. E isso seria o cafezinho gourmet tomado pelos verdadeiros bandidos, assistindo de camarote e olhando suas fortunas crescendo, legalizadas com inteligência é claro.

          Forma-se a tragédia irreversível, criada pela tolice da mensagem, onde está escondida a falha dela ao transmitir que mat4r é bom. Será continuada pela sustentação popular ao que não é inteligente, mas, é vendido como bom, entendido como solução, comprado como certo e não passa de mais um estelionato. Lembrando que este crime, é considerado “veja bem, não é assim que funciona”. Sabemos como funciona, temos pessoas muito inteligentes para identificar este funcionamento. A solução que precisamos, é escolher se vamos continuar achando que o bandido que deve morr3r é aquele do imaginário criado ou se vamos agir um passo a frente dos inteligentes que estão à margem da lei, da moral, da ética e por consequência, da nossa espécie que evolui para o bem, rejeitando a ideia de ser ou fazer o mal. Esta espécie humana evoluída, depende da tua contribuição individual para o coletivo, do teu cérebro escolhendo a aplicação da inteligência em benefício da sociedade. A espécie bandido de alta periculosidade, hoje está um passo à frente, já deixou de ser bandido burro. Cuidado com a tolice das palavras mal-entendidas, como organizado, facção, grupo, crime, banir e outras que sendo bem manipuladinhas, vão ficar na tua mente compondo frases bestas, do tipo “bandido bom é bandido m0r to.

          Em tempo, a frase que dá título a este texto, “bandido bom, era o bandido burro”, serve apenas para provocar o raciocínio. Ela perde o sentido, porque bandido e bom, não existe. O significado de uma das palavras, anula o da outra, tornando a frase sem sentido. O foco não deve ser o de adjetivar ou matar uma pessoa, é preciso frases também espalhadas massivamente, com a mensagem de escolha pelo bem. Trocar o foco, as frases, principalmente a forma de pensar, julgar e agir. Não tem nada perto disso em andamento, não será fácil e muito menos instantâneo.