Vai fazendo que vai se ajeitando conforme é feito. Ignorando que isso é assumir a falta de inteligência e qualificação, chegamos ao momento atual onde é comum perceber que algo está sendo feito assim, no embalo. O que parecia ser irrelevante, aquilo que foi visto como “não se sustenta, logo some” ou que foi aceito, com uma carga de arrogância implícita, “deixa pra lá, não vai dar em nada”, agora revela-se um erro grave.
As escolhas que resultaram neste erro, são muitas e de cronologia longa. Como exemplo, ao assumir que monopolizar é excelente para os donos ou oligarcas e horrível para todo o resto, a correção tola é falsear o afrouxamento das barreiras de acesso. O resultado vai se revelar horrível, por não começar a correção qualificando os que agora acreditam que também podem fazer. Parece confuso, principalmente a quem não faz leitura horizontal. Para entender com certa facilidade, observe no cotidiano, a diferença entre quem almoça uma marmita requentada e quem tem o privilégio de comer o que acabou de ser preparado, o conhecido almoço em casa, feito pela “fofó” ou pela “mamãe”. Igualamos o acesso ao almoço, ignoramos a qualidade do que está sendo almoçado e a pessoa da marmita aceita isso como normal. Tolice.
Tolerar a qualidade ruim, além da presença de uma contradição semântica, é um erro que está logo aí, em tua frente, aos teus olhos e ouvidos. Reduzir a desigualdade é mais do que urgente, mas, confundir isso com permitir que tenhamos coisas tão ruins ao nosso redor, não parece que vai trazer bons frutos. Na prática, até o momento, resultou em músicas horrorosas, comida nojenta e fraca, casas habitadas antes da conclusão e mal feitas, milhões de pessoas morando em loteamentos sem tratamento de esgoto, pessoas lamentáveis na política, roupas e calçados quase descartáveis e a lista vai longe, podendo chegar a forma tola como mentiras e desinformação viralizam em redes sociais.
Quando o assunto é empresarial, no tal mundo corporativo, fica mais preocupante. De um lado empresas com estrutura planejada, aplicando o que é conhecido há séculos e que não pode ser negligenciado. Do outro, o faça conforme a demanda do momento, use gambiarras, do teu jeito, se virar dinheiro está valendo. E quem acha que isso ocorre somente em botequinhos de esquina, assume baixa percepção. Primeiro por ter botequinhos de esquina com mais qualidades do que empresas que hoje faturam oitenta ou cem milhões. Depois, por acreditar que o quanto a empresa fatura, reflete a qualidade da gestão, estrutura e pessoas envolvidas.
Normalizar, adaptar-se ao que não é bom, forma a sociedade frágil de hoje. Seja por preguiça de fazer melhor, dificuldade de aprendizado, seja pelo preço impagável e seletivo que qualifica coisas para ricos e para outros. Seja por ter que falar que gosta de algo nitidamente ruim, quando na verdade não pode pagar pelo nível acima. Parece uma tolice acreditar que isso é democratizar, dar acesso a todos ou qualquer expressão inventada para suavizar a verdade. Frágeis, enganados, convencidos que coisas sem qualidade, podem ser boas e normalizando o vai fazendo do jeito que dá. “Se ajeita com o tempo”.
Ter opções, ter liberdade e acesso a fazer o que nosso talento também permite, é muito diferente do que está sendo feito hoje. Mais uma vez recorrendo a exemplos simples para fácil entendimento, seria horrível se somente uma pessoa ou uma oligarquia pudesse ter padarias e se somente houvesse a opção de comprar pães desse monopólio. É melhor ter milhares de pessoas fazendo e vendendo pães. Erramos quando compramos o pão de alguém que faz com farinhas impróprias para consumo ou que alteram a receita, gerando algo que não tem valor nutricional e aceitando isso como pão. Ou ainda, tolerando quem faz em ambiente de porquice aguda e chama de padaria um lugar que o consumidor entrando, jamais compraria sequer uma paçoquinha, mesmo que tenha toda a configuração estética de uma padaria qualificada. Quem comeu o pão feito com qualidade, mesmo percebendo a diferença aceita continuar comprando do outro, normaliza o ruim, mesmo que tenha na ponta da língua, frases clichês da tolice como: “é o que tem aqui perto” ou “é o que eu posso pagar no momento”. Isso é muito diferente de escolher entre a mesma camiseta azul ou branca. Também é diferente de ter talento para fazer pães e liberdade para colocá-los a venda.
Na próxima caminhada, ao sentir cheiro de esgoto em área urbanizada, ao olhar no horizonte próximo as casas sem pintura ou reboco, na próxima refeição requentada ou naquele restaurante “simprão, raiz”, ao comprar uma guloseima “tipo batata” ou “aromatizado com sabor de carne”, se foi entendido o que este texto convida a refletir, será uma aceitação consciente de que a falta de qualidade está normalizada nas tuas escolhas. Será uma permissão tua para que o ruim seja aceitável, normal. Começa no consumo básico do cotidiano e essa normalização atinge o teu voto, dando poder a pessoas que mal conseguem completar uma frase que faça sentido, quanto mais ter visão qualificada sobre a sociedade e suas demandas reais. Será o erro do acreditar que não precisa ser qualificado para ser bom.
Quando sem muito esforço, seja percebido que algo é fruto da falta de qualidade, como por exemplo trabalhar em uma empresa que vende e não entrega um produto qualquer, lembre-se da permissão ao ruim, aceitada como normal. Mesmo que não possa a ser falado, ao chegar no teu pensamento a frase “mas como essa pessoa conseguiu enriquecer sendo assim?”, lembre-se também do quanto a tua permissão ao avanço do que não tem qualidade, resultou no que está sendo agora percebido. Romper essa permissividade e conformismo, é mais inteligente do que pagar caro por algo sem qualidade, considerando que é normal, vai se ajeitar. A escolha entre barrar ou aceitar o que é ruim, não depende de muito mais do que a tua ação. Tolice ou força, escolha o que vai expor a tua qualidade.