Mudando Nossa Relação Com Os Impostos.

            Nossa relação com os impostos, precisa mudar. Para conviver com esta repulsiva obrigação, podemos romper a relação atual e construir uma nova. Esqueça reformas, esqueça gambiarras, se continuarmos fazendo assim, o resultado será sempre o mesmo. Há sinais indicando que, com mais acesso a informações, aumenta o número de pessoas que entendem onde e como estão sendo enganadas. É verdadeiro que a forma de agir neste assunto, será uma escolha individual.  Mas, não se iluda, talvez as tuas opções sejam bem menores que a tua percepção sobre elas.

            É fácil analisar o que temos hoje, começando pelo que é ensinado literalmente ou por metáforas, sutilezas, frases comuns do cotidiano, desde as primeiras interações dos nossos neurônios. Ouvimos e repetimos que quanto aos impostos, temos que ser pessoa esperta, dar um jeito de não pagar, de enganar quem arrecada, criar desculpas e meios de sonegar. Se possível, dar uma aparência de que não estamos fazendo nada fora da lei e será melhor ainda, se houver um jeito de colocar alguém para fazer leis que deixem ares de legalidade ao que criamos. Pode ter até nome difícil, como elisão (que não é uma Elis ou Elisa bem grande), pode inclusive expor a falta de vergonha, chamando de isenção. Isso para os pequenos, já aos maiores, é passado entre as gerações, a conhecida engenharia tributária, que cria coisas mais sofisticadas, como usar a figura da pessoa jurídica, comprar prejuízos, lavar dinheiro, pagar por imunidade e em alguns casos, estar com a caneta que faz um risco no valor devido em impostos.

            Todas as formas de ser pessoa esperta, legalizadas ou não, reprovariam em qualquer teste de moral. Perceba que é comum ouvir frases do tipo: a lei permite ou está tudo dentro da lei. Legalizado, permitido, mas, sujo, imoral. Isso também é uma escolha individual, a moralidade. Já ouvi de pessoas com diferentes níveis de conhecimento e patrimônio, frases tolas, repetidas as vezes até sem contexto, algo como: se tu preferes a moral eu prefiro pagar meus boletos, ou ainda, quem é certinho só se ferra, moral não compra comida, enquanto quem faz tudo certo fica patinando, tem quem faça de outro jeito e está voando ou não tem como fazer tudo por dentro, quebra. Assim e aqui, nossa análise pode ser encerrada, é um ponto que não se reverte, voltando a observar que enquanto seguimos os mesmos passos, as mesmas práticas, o mesmo jeito de lidar com o maldito imposto, segue aumentando as oportunidades para poucos realmente não pagar nada ou bem pouco. Alguns pensamentos enraizados, são de mudança impossível, não existe forma conhecida de alterar ou eliminar, são eternos. Este fator considerado menor, na verdade estará sempre limitando os estudos, as tentativas de fazer alguma reforma, de equilibrar ou melhorar o que temos hoje.

            Então, após muito esforço, muita pesquisa, chegamos à conclusão de que mexer com isso é perder tempo, deixa como está. Tolice. Sabendo que não é saudável, temos que fazer valer o que nos diferencia de outras espécies, a racionalidade, com ela somos obrigados a mudar. Assim como a pessoa fumante que sempre soube o quanto isso faz mal, obriga-se a mudar ao ter “um susto” maior, também com as que abusam do álcool e só mudam a relação com estas porcarias, quando por obrigação, igual com as pessoas que usam drogas ou são ignorantes extremistas. Seremos igualados a estas pessoas, se sabemos que está nos prejudicando e ainda assim escolhemos manter o fluxo atual. Trocando irracionalidade por burrice, tolice, fica mais fácil de entender.

            Faço um apontamento que por mais implícito e óbvio que seja, precisa ser literalmente exposto. A proposta não é tratar os impostos como algo desejado, amável, ter afeto ou falar que gosta de pagar e quanto mais melhor. Seria tão burrice (irracional) quanto não usar cinto de segurança no banco de traz dos carros ou ter moto com escapamento esportivo em meio urbano. Mudar a relação com os impostos, hoje significa trazer igualdade de condições e totalidade de alcance. Peço licença aos deuses e deusas da explicação que se contorcem ao ouvir algo simples, ousando contrariar a regra da complexidade e colocando a este assunto um objetivo de equidade. Não é para gostar de pagar impostos, é para acabar com o formato atual e o que vem em seu histórico.

            Observe outra frase comum: quem paga imposto é pobre. Esta sim é de complexidade maior e de múltiplas interpretações, por não termos um consenso ou aceitação do que é ser pobre. Reconhecer-se como pobre, é mais complexo e mais difícil. E, até mesmo os pobres, já nascem com as práticas e frases prontas, sobre a busca constante de um jeito de não pagar impostos, mesmo que enganados até nisso.  Igualar pobres e ricos em alguma coisa, em questões sociais, mais do que utopia é tentativa estéril, tem prazo definido para acabar e qualquer iniciativa neste sentido, vira piada.

            Uma testagem que não se apresenta acessível até este momento, é a quantificação de pessoas com nível de racionalidade suficiente, para entender a necessidade de igualdade de condições e totalidade, pesquisando nos grupos conhecidos de pobres e ricos. Sei que não é aceito na ciência a testagem tendenciosa, mas, há motivos atualmente para acreditar que entre os pobres, teremos muito mais pessoas capacitadas para a racionalidade do que entre os ricos. Se não for proporcionalmente, em quantidade os pobres levariam vantagem, a amostra é bem maior. Mesmo sem a confirmação numérica, quem circula no dia a dia entre periferias e locais onde a maioria é pobre, vai perceber que falta pouco para que esta massa de pessoas se una e comece a mudar a relação que temos com os impostos. Talvez esteja faltando somente uma palavra de entendimento comum, talvez o acesso a informações que por séculos lhes foram negadas ou escondidas, talvez pela simples saturação do sistema atual, impossível saber hoje qual será a faísca que provocará o incêndio de logo mais. O que está nítido, é que não são mais um grupo de pessoas tolas de fácil manipulação e entregues a subserviência em troca de pão e circo.

            Para acalmar a rejeição, ofereço o raciocínio que em iguais condições na relação com impostos, ricos não empobreceriam e pobres não enriqueceriam. A matemática é bem mais simples do que o economês. Quem ganha mil continuará assim e quem tem milhões, não vai deixar de tê-los, salvo em virtudes extraordinárias aos primeiros e burrice aos outros. Não é a igualdade de condições que incomoda aos ricos, é a moralidade que virá à tona, com a facilitação do controle e o expressivo aumento na soma arrecadada. Em palavras simples, na igualdade de condições, não tem como dar um jeito de não pagar, sem que a forma seja explícita, e aí quem vai cobrar, não será a fonte arrecadadora e sim, os que estão pagando. Um exemplo prático para tornar mais simplificado o raciocínio: eu pertenço ao grupo dos pobres, meu consumo é o essencial para alimentação, moradia, saúde. Meu consumo mais frequente é o supermercado. Em um cenário de aplicação de igualdade quanto a impostos, posso ter em meu cesto de compras um creme dental igual ao que vejo no carrinho passando a minha frente, sabendo que a pessoa que o está conduzindo, pertencente do grupo dos ricos. O valor do creme dental será exatamente o mesmo para ambos. Aqui nos igualamos. Não vamos pagar nada de impostos neste momento, porque eliminamos a relação atual, onde no valor do produto está a tributação embutida, mesmo que não seja recolhida. (uma observação, imposto para circular mercadorias, é tão ridículo que será o primeiro a ser extinto). Seguindo o raciocínio, eu recebo remuneração de salário, do qual tenho automaticamente descontado, do total bruto, sem qualquer abertura para “se for assim ou assado” a tributação obrigatória. A pessoa rica comprando o mesmo creme dental que eu, vai pagar sobre os recebimentos que tiver, não importa a fonte, não importa a quantidade, não importa quando e nem como esses recebimentos se tornam disponíveis a ele, porém, com o detalhe importante: na mesma taxa, mesma matemática aplicada obrigatoriamente a mim, pobre, de fonte única e minguada de recebimento. Simples, igual e com total alcance.

            É mais do que uma relação justa, é moralizada. Insisto neste assunto, por saber que estamos em um ciclo que precisa ser encerrado, para dar lugar a outro melhor. Assim como outras grandes mudanças nas relações sociais, essa também vai ter ponto de partida com os pobres. Por obviedade, manter a enganação é insustentável. Funciona por longos períodos, mas, sempre encontra o final. Tão tola quanto a pessoa que por um tempo foi enganada é a crença do grupo enganador na perpetuação do que faz.

            Aos que estão no mesmo grupo que eu, os pobres, considerem reconhecer-se como tal, depois avaliem quais opções reais temos de não pagar impostos, se estão embutidos no preço do que consumimos. Gaste um tempo para perceber que, mesmo sem o recolhimento de quem vende a quem deveria ser o destino, o valor é pago por nós. Perceba também que não há opções reais de não pagar sobre os recebimentos que temos, exceto nas migalhas. Após estas percepções, gaste mais um tempinho para entender que não é na complexidade do economês e na aura de sabedoria que envolve os deuses e deusas da explicação, que estará o entendimento sobre o quanto e como estamos pagando muito mais do que os ricos. Terminando as etapas de percepção básica, responda à pergunta principal de tudo isso: hoje, quais as tuas opções reais? A partir da resposta, perceba quem está sendo pessoa enganadora de si mesmo. Tolice fingir que não está vendo, além de infantilóide é permissão a perenidade de algo insano.